sábado, 11 de julho de 2009

O monge, o queijo e a vida real

Bom dia!!!
Mais uma vez li um artigo do Rodolfo Araújo e não resisti, estou repassando-o.
Inclusive gostaria de indicar a você o blog do Rodolfo.
Temas interessantes, inteligentes e porque não irreverentes.
Parabéns Rodolfo.
O recente texto sobre os livros de auto-ajuda rendeu alguns papos interessantes e reflexões idem. Os pitorescos temas que buscam analogias com o mundo corporativo dão origem a títulos emblemáticos. Vale qualquer coisa: um religioso e um título de líder ("O padre franciscano e o CEO" e "A freira e a cafetina"); alguém-avacalhou-alguma-coisa-que-me-pertencia ("Quem chutou o meu despacho?" ou "Quem molhou minha chapinha?"); segredos secretos que ninguém sabe ("Os mistérios do Jogo da Velha"); dicas infalíveis para conseguir tudo ("Como ganhar na Mega-Sena sozinho - apesar de esse livro ser um best-seller"); truques e quebra-galhos numerados ("Os nove hábitos dos esquimós canhotos" e "Seiscentas dicas para emagrecer muitíssimo"); além de adaptações de A Arte da Guerra para todos os gostos ("A arte da guerra no Vaticano", "A arte da guerra para bebês").
Além dos best-sellers instantâneos, temos também as historinhas motivacionais da moda, tão infantis quanto vazias, com enorme poder de proliferação através de emails que prometem resolver sua vida - mesmo que você não tenha pedido por isso. Senão vejamos:
Existe aquela do sujeito que atira do precipício sua vaquinha leiteira, da qual tirava o seu sustento e cujo gesto, ensinam, faria-o abandonar a estabilidade, desistir da sua zona de conforto e buscar novas conquistas. Além de ser difícil imaginar a subsistência de uma família apenas com leite, renunciando ao churrasco, o politicamente incorreto sacrifício do bovino revela a incapacidade de perseguir um objetivo. Não é preciso renunciar ao que se tem - de forma tão dramática - para buscar novas conquistas. Em vez da força de vontade sugerida, ensinar a vaquinha a voar pode revelar, isto sim, uma insidiosa fraqueza de caráter. A motivação deve ser um sentimento interno de superação, não uma atitude forçada pelo desespero. Um conselho tão útil como atirar-se no mar para aprender a nadar. Aumentar suas conquistas soa muito melhor do que começar do zero. Ainda mais de maneira forçada. Há também a aldeã que carregava um jarro d'água com um furo no meio mas, ainda que isso desperdiçasse metade do seu esforço, regava um lindo jardim que ela admirava pelo caminho. Antes de mais nada é um contra-senso realizar o dobro do trabalho por menos resultado - e isso não deveria ser incentivado. A tentativa de transformar uma árdua tarefa (muitas vezes realizada em condições sub-humanas na luta pela sobrevivência) num passeio no parque admirando flores pelo caminho beira o mau-gosto. É pintar de cor-de-rosa a cadeira elétrica. Esse exercício de ver a beleza em meio ao sacrifício só vale para o sacrifício alheio. Como dizia Joãozinho Trinta, quem gosta de miséria é intelectual. A mais recente - e que mereceu até citação da Míriam Leitão - é a do rico viajante que deixa uma nota de 100 euros com o dono de um hotel num pequeno vilarejo, enquanto vai escolher seu quarto. Nesse meio tempo o hoteleiro faz a nota girar pela cidade, onde todos eram devedores e credores de todos e o dinheiro recém-chegado vai saldando as dívidas em seqüência. Só que aí ele não gosta do hotel e vai embora levando consigo a cédula que circulou pelo povoado. Das duas uma: ou o hotel é gigantesco ou a cidade é minúscula, pois antes de o viajante terminar sua vistoria a nota já tinha percorrido a maioria dos estabelecimentos comerciais do vilarejo. Como o turista não ficou na cidade e não gastou ali um tostão, então não fez a menor diferença. Não havia crise nem dívidas, apenas falta de papel moeda. Uma comunidade que vivia muito bem na base do escambo. O dinheiro ali não serviu de nada. Qual o motivo então do otimismo por um futuro melhor?
Voltando aos livros de auto-ajuda, você mudou radicalmente a sua vida depois de ler algum desses títulos? Trocou de emprego? Foi promovido ou recebeu um aumento? (Só vale se tiver sido por causa do livro e não apesar do livro.) Se você flagrar o presidente da sua empresa lendo "O monge e o executivo" ou "Quem mexeu no meu queijo?", das duas uma: ele está procurando alguma coisa engraçadinha para falar na próxima Convenção da empresa ou você deve mudar de emprego. Pois se ele busca ali suas inspirações, então seu repertório é menor do que isso ou a situação está realmente desesperadora.
Quantas cópias você acha que um livro desses vende no Brasil? Cinqüenta mil? Cem mil? E quantos presidentes de empresas há no país? Bem menos, certo? Então quem compra esses livros? Muito provavelmente as pessoas que trabalham nas funções menos complexas, os estagiários e os estudantes. Depois do deslumbramento inicial, achando que sua empresa assemelha-se a algum próspero reino distante onde a felicidade abunda, o leitor cai na real e percebe-se rodeado de ogros que não compartilham seus hábitos de leitura nem compactuam sua visão pollyanna do universo.O mundo - especialmente o corporativo - não é um pequeno vilarejo entre o nada e o lugar nenhum, nem seus companheiros de trabalho se chamam Heitor, Cícero e Prático. Assim, ler "O monge e o executivo" ou "Quem mexeu no meu queijo?" provavelmente não lhe trará mais benefícios do que "Os três porquinhos", "O pequeno príncipe" ou até mesmo a Bíblia.Porque, na boa? Quando a coisa apertar, o monge come o queijo e o mundo que passe fome...
Rodolfo Araújo
Mestre em Administração de Empresas pela PUC-RJ,
Pós-graduado em Tecnologia de Informação pela FGV-RJ e
Bacharel em Comunicação Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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